Um autor no X (antigo Twitter) fez propaganda do seu livro a ser lançado daqui a uns dias. É uma defesa dos princípios protestantes nesses dias de “desilusão e desconstrução”. O título é: O que significa ser protestante. O autor escreveu ainda:
[O livro] oferece o que espero ser um caso claro e respeitoso a favor do protestantismo. Eu argumento que o protestantismo representa uma renovação do evangelho na igreja, uma remoção de vários erros e acréscimos e um novo compromisso com a primazia das Escrituras.
Pela descrição do livro no Amazon, parece que o autor espera estancar a saída de muitos protestantes para o catolicismo e ortodoxia oriental, numa busca de satisfazer “a fome por enraizamento histórico”. Evidentemente, por isso quer dizer o desejo de ter uma base sólida dentro da História da humanidade, como se o alto ritualismo oferecesse algo a mais.
Pelo que se pode perceber, com o autor compartilhamos a convicção da objetividade da verdade. Mesmo com espírito pacífico, o autor procura explicar suas crenças para o momento em que o mundo vive hoje. Ele não é da turma do tanto-faz.
Mas o protestantismo é uma religião problemática, por muitos motivos.
Foi observado nos comentários abaixo da postagem do autor no X que o título do livro defende algo negativo ─ o protestantismo. O movimento começou como protesto de Lutero contra abusos católicos. Por mais que as denominações têm tentado fugir do nome, com os mais conservadoras usando termos como “evangélico”, ele de fato define o movimento. O nome foi usado pela primeira vez em 1529, na Alemanha, e “na sua origem a palavra se referiu a algo diferente do catolicismo romano e, em certas maneiras, em oposição dele” (Douglas 1989, 309).
Aos protestantes e outras pessoas que querem fazer a vontade de Deus e viver de forma que agrade ao Senhor, digo o seguinte.
(1) A fome por raízes histórias é boa. Representa, talvez, a busca por coisas sólidas. Ela só se satisfaz, porém, em última instância, retornando às origens da igreja no primeiro século, no Novo Testamento. A única base para sentirmos parte da História divina se encontra somente nas Escrituras Sagradas.
Ademais, a Bíblia como um todo nos revela um Deus que persegue incansavelmente ao longo dos séculos, desde a Queda, o seu plano de salvação da humanidade. Temos a felicidade de vivermos hoje deste lado da solução na Cruz de Cristo. Mais ainda, participamos, com todos os santos, da grande operação de resgate, que é definida pela divulgação pessoal da Boa-Nova do perdão. O Senhor é o Deus que fala e faz, que promete e cumpre, que age e inspirou homens a desvendar o seu plano.
O protestantismo diz promover a “primazia das Escrituras”. No entanto, o que recebe a primazia é o movimento histórico da Reforma Protestante. A Bíblia é interpretada pela lente desse movimento, mas deve acontecer o contrário. As denominações valorizam mais os seus credos, leis, estruturas e hierarquias acima das Escrituras. Nenhuma história depois da conclusão do Novo Testamento sobrepõe a revelação divina nas suas páginas. Nelas, o modelo nos foi apresentado e todo movimento, grupo e ideia deve ser submetido ao crivo bíblico.
Não somos protestantes e não temos comunhão com estes porque eles rejeitam:
- a autoridade bíblica, indo além do que está escrito, 1Co 4.6;
- a unidade bíblica, justificando e gloriando nas suas divisões, 1Co, caps. 1-4;
- a conversão bíblica, ensinando de forma errada o que fazer para receber a salvação (Matheny 2024, 12-15).
(2) É libertador poder defender unicamente o que diz a Bíblia, em vez de um movimento religioso. Todo movimento tem líderes humanos com ênfases e princípios determinados pelo seu tempo. Os cristãos, porém, desfrutam da grande vantagem de reportar sempre às Escrituras, sem ter que explicar ou adequar novamente para uma outra geração a sua posição religiosa. O evangelho é sempre adequado e apropriado para toda geração. Não há necessidade de identificar, posteriormente, uma religião histórica com a verdade da Bíblia, tentando encaixá-la dentro do modelo bíblico ou forçando os princípios bíblicos para dentro de uma caixinha denominacional.
(3) Os cristãos se encontram em posição vantajosa para comunicar a Boa Nova de Cristo. Sobre o plano de Deus não há nada de negativo, condenável ou sinistro. A História da Salvação lida com o negativo do ser humano, o pecado, formando assim a narrativa do amor, do sacrifício próprio e da fidelidade. Não existe nada vergonhoso, indigno ou injurioso dentro do ensino de Cristo. Pode-se afirmar que o evangelho não precisa de defesa contra aspectos sombrios.
(4) Os cristãos devem continuar avaliando sua própria prática à luz das Escrituras, para retirar dela qualquer vestígio ou influência que não seja bíblica. Gente de fora e de dentro querem nos levar para o sectarismo denominacional, taxar-nos de nomes além de cristão e confundir a linha entre quem está em Cristo e “os de fora”. A vigilância, portanto, tem de ser constante.
Quem está cansado das religiões “históricas” justificando sua existência e promovendo suas doutrinas próprias pode olhar para as Escrituras, crer na verdade do evangelho e obedecer ao mandamento do Senhor e Salvador que os apóstolos ensinaram, 2Pe 3.2. É o que todos devemos fazer. Assim, não nos encontraremos fazendo defesa de uma divisão religiosa e nem rejeitando por completo uma necessária expressa da fé.
REFERÊNCIA: DOUGLAS, J.D., et al. Concise dictionary of the Christian tradition. Zondervan, 1989. MATHENY, Randal. Cristão sem denominação. Alcance, 2024.